Estou trabalhando em Ourilândia do Norte, cidade que fica próximo a Xinguara e Eldorado dos Carajás no sul do Pará.
Tenho acompanhado; pela mídia e por informações de um companheiro de trabalho que passava por lá quando voltava de sua folga; todo conflito que aconteceu no último final de semana em uma das fazendas do grupo Santa Bárbara. É basicamente o que todos viram pela TV.
Abaixo, segue um texto de Altino Machado do Blog da Amazônia que trata um pouco sobre o assunto.
A situação foi estabilizada. Não temos mais um conflito deflagrado. Temos a presença ostensiva de 22 homens do Comando de Operações Especiais que foram deslocados de Belém para cá. Objetivamente, as estradas estão desobstruídas, reunimos com as partes e estabelecemos alguns acordos para evitar conflitos armados e mortes. Vamos iniciar uma operação de desarmamento agora. Fora isso, o procedimento legal do inquérito policial.
Como o governo paraense interpreta o acirramento do conflito fundiário no Estado?
É um problema estrutural. O problema da concentração fundiária é uma verdadeira balbúrdia no Pará. Lidamos com glebas estaduais, com áreas da união de distintas formas. No mais, o que existe é uma indefinição acerca da legitimidade da propriedade de muitas áreas supostamente privadas. Algumas foram griladas, outras compradas com contratos de gaveta e estão sob suspeição na Justiça. O centro do problema é que a concentração fundiária deixa muita gente sem terra. O problema tem se agravado com o movimentado liderado pela senadora Kátia Abreu, do Tocantins, e por outros opositores da governadora Ana Júlia Carepa. Num movimento de agitação política, esses adversários políticos vieram ao Pará para insuflar fazendeiros a fazer justiça com as próprias mãos. É um grupo político articulado, ligado ao PSDB e ao DEM. Chegaram a organizar uma audiência pública, em Marabá, em nome de uma sub-comissão da Câmara que trata de questões ligadas à agricultura. Eles tendem a jogar descrédito sobre as instituições estabelecidas como capazes de resolver os conflitos. A questão é muito mais complexa do que colocar a polícia para retirar os posseiros das áreas, especialmente tendo o histórico que temos, como o massacre de Eldorado de Carajás. Cada operação dessa custa milhões para os cofres do Estado. Estamos cumprindo as reintegrações com muito diálogo. Ao retirar posseiros, temos que providenciar desde assistente social a áreas provisórias para que não voltem para as mesmas áreas. Fazemos um atendimento humanizado e não apenas como uma questão policial.
Como se pode alcançar alguma paz e sustentabilidade econômia e social no cenário de acirramento dos conflitos fundiários no Pará?
A paz só virá com a solução da causa do problema. Podemos colocar policiais o tempo todo aqui e não iremos alcançar a paz duradoura. Isso só acontecerá com a regularização fundiária. Temos que definir as áreas que são destinadas à reforma agrária, para assentamentos rurais, de acordo com os preceitos da legislação ambiental. Precisamos, ainda, definir, no que se refere às áreas empresariais, se elas não são griladas. Temos uma tradição de grilagem, de títulos falsos, e de concentração de muita terras. Isso gera instabilidade e cria a base para os conflitos.
Existe algum avanço?
O governo federal emitiu uma Medida Provisória onde se pretende fazer regularização fundiária na Amazônia em áreas federais, em acordo com os governos estaduais. Pela primeira vez o governo federal encarou o problema da regularização fundiária da Amazônia. O programa Terra Legal começa pelo sul e sudeste do Pará.
O governo federal e estadual não têm sido lentos demais nesse aspecto?
Nós temos feito tudo o que está ao nosso alcance. Obviamente, há uma lentidão histórica do estado brasileiro, dos serviços públicos. Não podemos tapar o sol com a peneira. Mas é preciso reconhecer os avanços do governo Lula e, se você me permite, os avanços na gestão da governadora Ana Júlia Carepa. Nós colocamos o tema no centro da pauta do desenvolvimento. Mas existem complicações políticas.
Quais?
Uma estrutura burocrática que acabou absorvendo atribuições de regularização fundiária e de desenvolvimento agrário. Uma estrutura que tem atribuição de definir qual a área que vai para a reforma agrária, bem como de criar infra-estrutura local ao invés das prefeituras. Existem ainda problemas conflitivos com o Judiciário, que decide que tem que fazer reintegração de posse. Nós deslocamos as tropas e aí surge uma decisão contrária porque a decisão liminar é cassada na própria Justiça. Portanto, há uma lentidão por causa do sistema de instituições típicas de uma democracia. Acho que a tendência é acelerar porque essa questão assume cada vez mais relevância no debate sobre o desenvolvimento da Amazônia. Como a Amazônia assumiu um papel mais importante no debate sobre o futuro do Brasil, talvez agora as instituições vão encarar a realidade com mais carinho.
Na sua avaliação, o que aconteceu no confronto que deixou feridos pelo os sem-terra e um segurança na fazenda do empresário Daniel Dantas?
O que pude observar aqui é que algo irritou profundamente os assentados sem-terra. Houve troca de tiros. Dentro da área existem três grupos distintos de sem-terra. Existem os que são aliados ao MST, os que são ligados à Federação dos Trabalhadores em Agricultura Familiar e existem os posseiros independentes. São grupos distintos que não têm relação entre si. Portanto, quando existe um conflito não é necessariamente o MST.
A presença de grupos empresariais que adquiriram extensas áreas contribui para o acirramento do conflito fundiário?
O que contribui para o acirramento é a concentração fundiária. Existe um movimento recente de compra de áreas gingantescas no Pará por grupos empresariais cuja origem dos títulos está sendo questionada pela Justiça. Isso era insatisfação dentro do empresariado local e tensão social. Isso é o cenário perfeito para o que nós vimos aqui.
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